Quando os americanos forem às urnas em 8 de novembro para escolher entre a democrata Hillary Clinton e o republicano Donald Trump, estarão decidindo bem mais do que o nome do próximo ocupante da Casa Branca.
Além da Presidência, estarão em jogo 34 das 100 cadeiras no Senado, todas as 435 cadeiras da Câmara dos Representantes (equivalente à Câmara dos Deputados), 14 governos estaduais e de territórios e vários cargos locais.
Os eleitores também votarão em 154 referendos em 35 Estados, sobre temas que vão de pena de morte e controle de armas à legalização da maconha e obrigatoriedade de uso de camisinhas em filmes pornôs.
De acordo com o site Ballotpedia, que reúne dados sobre as eleições nos Estados Unidos, os resultados nesses referendos poderão afetar mais de 205 milhões dos 324 milhões de habitantes.
Muitas das propostas levadas a referendo receberam milhões de dólares em campanhas contra ou a favor e, apesar de serem decisões específicas sobre leis estaduais (ou, em alguns casos, locais), podem ter um impacto mais amplo no debate nacional sobre determinados temas.
Maconha
Um desses temas é a legalização da maconha, que irá a votação em nove Estados. Eleitores de Nevada, Massachusetts, Maine, Califórnia e Arizona decidirão se aprovam o uso recreativo, como fizeram a capital e outros quatro Estados (Alasca, Colorado, Oregon e Washington).
Em Arkansas, Flórida, Montana e Dakota do Norte, a decisão será sobre o uso medicinal, que já é permitido na cidade de Washington e em 25 Estados.
Mas, pela lei federal, a maconha continua proibida e está enquadrada na categoria reservada às drogas mais perigosas, como heroína.
Apesar de o governo federal respeitar a legislação dos Estados, a diferença entre as leis causa vários problemas para empresas nesse mercado, entre eles a impossibilidade de abrir contas em bancos, que temem serem processados pela lei federal por receber dinheiro proveniente de cultivo ou venda de drogas, ou aceitar cartões de crédito e a necessidade de realizar as transações em dinheiro vivo.
Segundo analistas, uma vitória do "sim" nos referendos sobre uso recreativo, especialmente na Califórnia (onde o uso medicinal é permitido desde 1996), poderia aumentar a pressão sobre o governo federal para mudar sua postura.
"Se a Califórnia legalizar, haverá um impacto muito grande na política federal sobre a maconha", disse à BBC Brasil o professor de direito Sam Kamin, responsável pela disciplina de legislação da maconha na Universidade de Denver, no Colorado.
"A Califórnia se tornaria o maior Estado a legalizar (o uso recreativo), e é também a fonte de grande parte da maconha no mercado negro nos Estados Unidos", observa Kamin.
Pesquisas de opinião indicam que os americanos estão cada vez mais favoráveis à legalização da maconha. Segundo levantamento do instituto Pew Research Center divulgado neste mês, 57% a apoiam. Há uma década, eram 32%.
Outra pesquisa, do Gallup, também deste mês, revela que 60% são favoráveis à legalização, maior percentual em 47 anos. Em 1969, somente 12% apoiavam.
Pena de morte
A Califórnia - que terá um total de 17 referendos nestas eleições - também está no centro de outro tema polêmico, com duas votações sobre a pena de morte.
Uma das propostas prevê o fim da pena capital, que seria substituída por prisão perpétua, aplicada retroativamente aos quase 750 prisioneiros que estão no corredor da morte no Estado, o maior do país.
Apoiadores da medida dizem que a pena de morte já custou ao Estado US$ 5 bilhões desde 1978, mas somente 13 condenados foram executados nesse período. Desde 2006, as execuções estão suspensas por decisão judicial devido a preocupações com o procedimento de injeção letal aplicado.
Mas defensores da pena capital apoiam uma segunda proposta levada a referendo, que pretende "consertar" os problemas enfrentados pela prática no Estado, agilizando o processo de apelação após condenações e reduzindo custos.
A pena de morte também é tema de referendo em outros dois Estados. No Nebraska, eleitores decidirão se rejeitam uma lei do ano passado que aboliu a pena de morte.
Em Oklahoma, a proposta pretende proteger a pena de morte de eventuais decisões judiciais ao estabelecer que, caso um tribunal decida que determinada execução é "punição cruel", a sentença será mantida e um novo método de execução será empregado.
Há expectativa de que as decisões nesses referendos possam influenciar a discussão nacional sobre a pena de morte, que é adotada em 30 Estados e pelo governo federal e que já foi abolida por 20 Estados.
Uma pesquisa divulgada no mês passado pelo Pew Research Center revelou que 49% dos americanos são favoráveis à pena de morte, queda de sete pontos em relação ao ano passado.
Segundo o diretor-executivo do Death Penalty Information Center (Centro de Informações sobre a Pena de Morte), Robert Dunham, fatores como o risco de executar inocentes e os altos custos têm influenciado a mudança de opinião de muitos americanos em relação à pena capital.
Ele não arrisca, porém, prever como os resultados podem afetar a discussão sobre o tema. "Temos de esperar para ver", disse Dunham à BBC Brasil.
"Se os resultados forem apertados, isso por si só já nos diz algo. Porque, há 20 anos, não seriam. Há 20 anos, a pena de morte teria apoio incondicional", observa.
Camisinha, sacolas e moradores de rua
Os temas em votação nos referendos são variados. Quatro Estados votarão medidas que reforçam o controle de armas. Arizona, Colorado, Maine e Washington votarão propostas de aumento do salário mínimo. Em Dakota do Sul, os eleitores decidirão sobre a redução do salário.
Os eleitores da Califórnia decidirão se rejeitam uma lei de 1998 que restringia a educação bilíngue em escolas públicas, se mantêm uma lei que proíbe sacolas plásticas e se aprovam a exigência do uso de camisinha durante cenas de sexo em filmes pornôs.
Essa última proposta sofre forte rejeição desta indústria, que argumenta que os atores são testados periodicamente para evitar doenças sexuais e já ameaçou se mudar para outro Estado caso a medida seja aprovada.
Em San Francisco, uma proposta polêmica proíbe barracas de moradores de rua nas calçadas. Pela medida, pessoas dormindo em barracas deverão ser levadas para um abrigo (permanente ou temporário) ou receber passagem de ônibus para outra cidade. Caso se recusem, serão notificadas de um prazo de 24 horas para se retirarem, sob pena de terem seus pertences removidos.
A proposta tem apoio da prefeitura, do setor hoteleiro e de grandes investidores do setor de tecnologia (que muitas vezes são apontados por críticos como um dos culpados pela crise de moradia na cidade, provocada pela alta nos preços de aluguéis).
Os defensores da proposta dizem que alguns locais da cidade viraram verdadeiros acampamentos de moradores de rua, com dezenas de barracas, e são perigosos. Mas opositores temem que a medida criminalize os sem-teto e afirmam que o efeito seria apenas estético e não resolveria o problema.
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